Quando a mentira se torna um vício…
Sabemos que crianças costumam mentir para se livrar de consequências ruins e este comportamento, mesmo que previsível, é bastante ruim. Depois dos dez anos, espera-se que a criança já tenha assimilado a necessidade de assumir as consequências de seus atos pois, educada por seus pais, entende a importância de agir corretamente. Quando este amadurecimento não ocorre, o que era algo aceitável na infância, pode tornar-se uma patologia.
O adolescente mente para mostrar poder, maturidade e também usa esse artifício como mecanismo de autodefesa. No adulto a mentira pode ser patológica ou residual, revelando um indivíduo infantilizado ou até incompleto.
No mundo adulto, este tipo de compulsão afeta diretamente os relacionamentos amorosos, o trabalho, a vida como um todo. O mentiroso é uma pessoa carente e insegura.
A “síndrome de Pinóquio” pode mostrar-se de duas formas. A primeira é a mentira compulsiva, em que são inventadas histórias para livrar-se de problemas. Há a consciência daquilo que está sendo feito, porém o mentiroso encara o hábito como uma “mentira piedosa” ou seja, inofensiva. Contudo, com o tempo, a saúde mental pode tornar-se comprometida com enorme ansiedade em ser descoberto, e esses aspectos podem desencadear depressão.
Pessoas anti-sociais, narcisistas e histriônicas (excesso de emotividade e busca de atenção) tem maior tendência a mentir patologicamente.
O mentiroso não vê o abismo em que se afunda, não percebe o mal que causa a si mesmo e aos outros. Tive uma paciente que namorava há quarto anos um mentiroso compulsivo. Ele contou a ela que havia feito faculdade e que foi um excelente aluno. Ele dizia que não se casaria com ela ainda porque o temperamento dela era muito instável e ela era muito nervosa, etc… E nisso os anos se passavam… Um belo dia ela descobriu que ele tinha, além dela, um outro relacionamento sério. Como eles moravam em diferentes cidades, o inteligente mentiroso montou um esquema de guerra! Quando minha paciente ia para sua casa ele buscava no armário uma mochila com porta retratos, langeries, perfume e outras coisas dos dois… A casa ficava toda “decorada”… quando ela partia ele guardava todas as coisas e pegava a mochila da outra namorada, procedendo da mesma forma. Formado? Nada disso, ele nunca tinha frequentado faculdade alguma. Cheguei a atender este cidadão que se mostrava solícito, apaixonado e completamente sincero. Ao descobrir as mentiras, minha paciente terminou a relação e não entendia como uma pessoa tão inteligente como ela, nunca havia desconfiado de nada. Isso acontece porque o mentiroso convence muito bem! É um sujeito articulado, simpático e inteligente. Alguns mentirosos patológicos têm consciência da sua incapacidade de estabelecer um diálogo sem que nele haja mentiras, mas, no entanto, não conseguem controlar esta conduta. Outros não percebem suas mentiras e vivem em um mundo de fantasias. Todos pagam um alto preço por inventar, deturpar e aumentar a verdade: vivem “vidas de mentira”, repletas de fantasmas, mal-estar e problemas que não são solucionados.
As principais características do mentiroso patológico são: impaciência, manipulação, sedução, intolerância a críticas, não sentir culpa e incapacidade de viver relações afetivas maduras.
É muito difícil este paciente procurar ajuda especializada para tratar este sintoma. Primeiro porque ele não se acha doente e não acha que faz mal a ninguém. Assim como na dependência química, para ser tratado, o compulsive precisa admitir que tem um transtorno que o domina e sobre o qual é impotente, além de ter a humildade de aceitar uma ajuda especializada. Normalmente o tratamento só acontece caso ele sofra algum impacto muito devastador. Quem sofre mais são as pessoas que convivem com as mentiras, e talvez sejam elas quem deveriam tratar-se para se livrar da co-dependência emocional que tem deste carismático mentiroso.
Silvia Barros
Psicoterapeuta
Trabalha com adolescentes, adultos e Casais.
Site: www.silviabarros.com
Tels: 19 -32941005/32526513
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